Coluna do Eliabe
A Praça dos três Poderes e seus arredores: aspas e ascos
2.4.16
Por Eliabe Castor, jornalista
Os passos largos,
roupas mínimas, maquiagem extravagante e aromas de perfumes baratos denunciavam
as intenções daquelas mulheres que caminhavam sobre o piso histórico e quase
sagrado da Praça Venâncio Neiva. Era um “sacrilégio” para os puritanos que
circundavam, de forma apressada, os arredores do Pavilhão do Chá. Sim, aquele
local, que outrora recebia famílias abastadas de uma João Pessoa que há muito
sucumbiu, hoje é palco da desgraça social.
Bem perto, juízes e
promotores, com pastas e documentos “ultra secretos” ignoravam ou fingiam não
ver as jovens ou velhas meretrizes, cujo olhar mais atento revelava o viço
quase inocente das que têm pouca idade em contraste à desilusão das mais
velhas. A essas, restou-lhes apenas um mundo de sorrisos raros e falsos, no
qual lágrimas são quase sempre verdadeiras.
Caminhando mais um
pouco pude observar vendedores de caldo de cana e água de coco disputando uma
“competição” silenciosa, quase religiosa, a sede dos transeuntes sedentos por
líquidos sob o sol abrasador. O silêncio só era quebrado com os berros dos
deputados que lutavam por interesses próprios na Assembleia Legislativa. O
cheiro de churrasquinho vendido na porta daquele “poder” lembrava as batalhas
entre portugueses e holandeses há muito travadas na cidade alta e baixa do que
hoje é o Centro Histórico.
A grita, confesso,
perturbou minha alma. Zumbis em formato de crianças arrastavam correntes com
mãos estendidas buscando “trocados” para adquirir drogas ou sobras de comida
nas portas dos restaurantes instalados naquele ponto da cidade. Mas isso não
importava para elas, pois as opções disponíveis eram eficientes e limitadas. Um
frasco de cola ou “quentinha” reluzente retirava, mesmo por breves momentos,
sua fome, concedendo-lhes esperança de um dia melhor e menos doloroso. Para
aquelas almas “desalmadas” viverem o hoje era, e é, o grande desafio.
Encostados nas paredes
históricas do Palácio da Redenção, um grupo de travestis atolados em roupas
mínimas flertavam com possíveis parceiros, enquanto o governador do Estado, no
segundo andar daquele prédio luxuoso, empanturrava seu estômago com lagostas,
tendo em suas mãos o “bico de pena” mágico. Sim, mágico e poderoso por ter a
prerrogativa de quem deve ir ou não para a “guilhotina”. Um instrumento que
daria, se vivo, calafrios no revolucionário francês Robespierre.
Eu ainda não sei o que
realmente é aquele quadrante que abriga tão numerosas personagens. Seria a
“Bastilha”? O fim ou o nascimento de mitos? O inferno de Dante ou o céu dos
católicos? Não pude identificar, mas vou sempre lembrar as palavras de fé
daquele pastor solitário que, inflando seus pulmões, afirmava ser Jesus o
salvador, sendo ele observado por uma vendedora de acarajé devota do candomblé e
não menos crente que o amor salva. Por fim, devo admitir que aquele
“microcosmo” é o retrato do nosso país, cuja mensagem positivista “Ordem e
Progresso” fincada em nossa bandeira está cada vez mais desbota.
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