REINALDO AZEVEDO: Jean Wyllys tem direito e, quem sabe, motivos para sentir medo. Mas quais? Parece-me que ele politiza em excesso o que é decisão pessoal

Foto: reproduzida no blog do RA

REINALDO AZEVEDO

O deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ), que foi reeleito, não vai assumir o novo mandato. Está fora do país, em local ignorado, e diz que não volta — não tão cedo ao menos. Pretende também cuidar de sua vida acadêmica. Lastima o clima no país e sugere que o bolsonarismo, ora triunfante, está na raiz da decisão. Os dias não são os mais suaves. Mas, salvo engano, por enquanto ao menos, Wyllys optou pelo autoexílio, saindo de um país em vigora uma democracia, ainda que não esteja a seu gosto, ainda que não esteja a meu gosto, ainda que não esteja ao gosto do J. Pinto Fernandes. Os (des)gostos, pois, variam também segundo os valores de cada um.

Wyllys pertence a um partido de esquerda. Eu sou um liberal. Com ou sem Bolsonaro na parada, divergimos — até já trocamos gentilezas por escrito. E é possível que exista um núcleo comum de restrições. Certa feita, ele resolveu me ofender e me chamou de “bichona enrustida”. Achei estranho que um gay empregasse a palavra “bichona” para tentar ofender. Especialmente sendo um militante da causa. Mas não sou ombudsman das incoerências alheias, não é mesmo?

Não vou aqui censurar a sua decisão segundo os olhos de um militante: “Ah, fique para lutar! Vai correr justo agora?” Ou ainda: “Assim fica fácil; é só a coisa apertar, e você corre?” Mais: “Pô, se todos fizeram como você, o país fica entregue aos Bolsonaros…”

Não quero ser juiz de seus medos. Sempre acho estranho quando alguém tenta universalizar seus próprios motivos para o outro se apavorar. Acredito, sim, que ele seja um dos alvos da boçalidade extrema que toma áreas das redes sociais. Também sou, ainda que outras sejam as razões. Sei lá se vai chegar a hora em que também ficarei de saco cheio. De sua própria vida, sabe ele. Assim, considero impossível opinar se faz bem ou faz mal em partir.

O que lastimo em suas acusações, aí sim, é a imprecisão. Ignoramos se há inquérito aberto para apurar a origem dessas ameaças. Nada sabemos a respeito. Wyllys não é obrigado a ficar. Mas, como pessoa pública que é, ainda mais porque ungido pelo voto, parece-me que tem o dever de ser mais claro.

O que vaza em sua carta é uma insatisfação com a situação do país. Bem, milhões de pessoas estão igualmente insatisfeitas. Em política, há vitórias e derrotas também para os que não são profissionais da área. Nem todos podem fazer a escolha que ele faz. Ademais, parece-me que continuará nas redes, quem sabe à espera de um melhor momento para voltar. Com a sua carta, é claro que está fazendo política.

Como pessoa preocupada com as instituições e com a sua eficácia, obrigo-me a perguntar o que ele efetivamente fez, no terreno legal, para evidenciar a gravidade de eventos que desconhecemos — graves o bastante para fazê-lo deixar o país.

Tenho a impressão de que ele elevou a temperatura da narrativa para dar a uma decisão que é, primariamente, de cunho pessoal um viés político, que saberá reverter a seu favor no tempo certo. A sua decisão, como se percebe, já é bem mais barulhenta do que seu eleitorado, que mingou bastante em 2018.

Espero que formalize suas acusações à Justiça e que reúna evidências da perseguição e as torne públicas. Agindo como agiu, ele só forneceu motivos para que seus adversários comemorassem. E o resultado, do ponto de vista institucional, é absolutamente inócuo. No mais, que seja feliz! #Opinião #Política

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